O equilíbrio na doçaria
A doçaria da Beira Baixa a que fui habituada na infância era perfeita no equilíbrio entre o doce e o amargo, o seco e o fofo. Os biscoitos, o pão de ló, o bolo de canela, o bolo de mel, o bolo de festas, as filhozes. O sabor perfeito a que eu chamo a poesia doce. A minha avó materna e as minhas tias paternas eram verdadeiras artistas.
E havia a doçaria da Fernanda, os bolos da Beatriz, os bolos da fábrica da Figueira da Foz.
Mais tarde provei doçaria conventual e notei o exagero na quantidade de açúcar. Fiquei, no entanto, encantada com os pastéis de Tentúgal (que ganhariam em baixar a quantidade de açúcar no recheio de gemas de ovo), os pastéis de Santa Clara, os ovos moles de Aveiro, as queijadas de Sintra.
Há um encantamento geral pelos pastéis de nata e pelos pastéis de Belém. Mas quem, como eu, provou um pastel de nata, de nata mesmo, a cor e o sabor da nata, como fazia a Beatriz, nunca mais se consolará com qualquer outro. Tenho tentado reproduzir a fórmula perfeita da massa e do recheio desses pastéis de nata da infância sem qualquer sucesso. Mas ainda não desisti.
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Nem Sortelha escapa?
Deve ter sido mais uma alucinação auditiva: colocar hélices eólicas praticamente em cima desta aldeia histórica... para adquirir uns trocos, pelo que percebi do presidente da Câmara, progresso e tal, conciliar o passado com o séc. XXI... foi a ideia que ficou... estamos aqui isolados...
Só quem não percebe nada de nada dos nossos maiores trunfos, o que é genuíno e se mantém no tempo, esses lugares procurados pelo sossego, pela beleza indescritível desse espaço... a pedra, as casas, o silêncio...
Nem Sortelha escapa à voracidade desta gente que nada percebe do que é um país, a alma desse país, a beleza desse país?
Nem Sortelha escapa à falta de sensibilidade estética desta gente que nada percebe de um país poético, onde cada vez temos mais dificuldade em ouvir o silêncio?
Nem Sortelha escapa à ignorância cultural e histórica desta gente que nada percebe sobre equilíbrio e organização das diversas áreas territoriais?
A Beira Baixa da minha infância já foi invadida pelas hélices eólicas, a tal ponto que o perfil das suas montanhas já está irreconhecível. Mas enfim, há lugares em que se justificará o aproveitamento do vento. Mas em Sortelha? Uma aldeia histórica? Única? Que permanece no tempo?
Lá terei de procurar a Petição para assinar, pois ouvi no rádio que já corre na internet.
Petição online Vamos salvar Sortelha: está aqui. É certo que só nos envolvemos no que de alguma forma, por vezes inexplicável, nos toca e sensibiliza. A beleza poética dos lugares da Beira Baixa está ligada às minhas memórias mais felizes. Ainda há pequenos oásis por destruir, mas já são muito poucos. Sortelha é um deles. E não é só a beleza indescritível desta aldeia, é o silêncio, o ar ainda respirável, a sensação de espaço...
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Do Baú:
Partir como quem nunca esteve
Sombra de uma nuvem
que passa em câmara lenta
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Do Baú:
A tarde escurece em tons cinza
Vejo-a tornar-se noite, lentamente
também dentro de mim...
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Do Baú:
Porque passamos a vida a dizer adeus?
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Do Baú:
Quem de mim sabe o nome
e a ternura?
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Do Baú:
A luz escorrega pela sala
lentamente
ilumina-me agora o caderno
toca-me nos dedos
amarelada e ténue
treme por trás da folhagem
Ficar assim
muito quieta
e deixar o vento passear por mim
sem nada alterar
nem esta tarde quase-noite
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Do Baú:
Que fiz eu a esse tempo todo
que a realidade insiste em mostrar
que passou
por mim pelos demais pelas coisas
e eu sem saber o que fiz a esse tempo
sem o ter sentido passar
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Do Baú:
Nunca como agora
senti esta urgência de chegar a casa
Nunca como agora
perante este céu a escurecer
com as árvores por companhia
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Do Baú:
Casa em ruínas
sol oblíquo
jardim outonal
Tempo-espaço concreto
onde desejaria permanecer